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segunda-feira, 27 de julho de 2015

Faz hoje 45 anos!...

A meio da manhã de hoje o meu telemóvel tocou e do outro lado o meu amigo Ricardo Soromenho, de forma direta pergunta com ar de riso: “Sabes que dia é hoje?” (de vez em quando ele vem com o mesmo tipo de pergunta, referente a uma qualquer efeméride).

Segunda feira, dia 26 ou 27, sei lá?!... 27 confirma o Ricardo que logo acrescenta: “Faz hoje 45 anos que morreu o Salazar”.

Áh! Já percebi, queres tu dizer que faz hoje 45 anos que embarquei para a guerra de África, para a Guiné!...

Isso mesmo! Confirma o Ricardo.

De facto naquele dia 27 de julho de 1970 o navio de carga e passageiros “Ana Mafalda” estava acostado ao cais da Rocha do Conde de Óbidos e os meus pais que tinham ouvido no rádio a notícia da morte do ditador português, mantinham a secreta esperança que o navio não partisse de Lisboa.

Mas não, para desencanto dos meus pais o barco ia mesmo partir levando o seu filho mais velho para terras longínquas que se encontravam em guerra e de onde muitos jovens não regressariam.

Na minha memória guardo a imagem do meu pai, com metade da idade que hoje tem, olhando fixamente aquele barco, sem dizer palavra mas adivinhando-se que se lhe fosse possível dar um valente murro e afundá-lo de vez, certamente fá-lo-ia.

A ditadura manteve-se mesmo após a morte de Salazar e lá longe nas matas de Angola, Moçambique e Guiné os combates entre o Exército Português e os Movimentos Independentistas continuaram tal como continuaram a morrer milhares de jovens de ambos os lados.

No primaveril dia 25 de abril de 1974, um punhado de militares, onde predominavam aqueles com patente de capitão, levaram de vencida uma revolução que acabaria por colocar fim à Guerra Colonial e instaurar o regime democrático em Portugal.

Alguns meses antes eu tinha chegado a Portugal, depois de 26 meses de Guiné, sem ter disparado um tiro, sem ter recebido um tiro, mas quase, quase, a juntar as botas devido a um terrível ataque de paludismo que me deixou às portas da morte.

Outros jovens, alguns setubalenses, vieram daquela guerra com estilhaços no corpo, outros não viriam de lá vivos, como foi o caso do meu amigo Fernando, troineiro, morador na Fonte Nova, que deu a sua vida numa guerra estúpida e sem sentido, como aliás o são todas as guerras.

Rui Canas Gaspar
2015-julho-27

www.troineiro.blogspot.com

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